Eu nunca a vi chorar, nem reclamar,
nem falar mal de nada, era uma mulher sorridente que usava um decote de atitude,
seu maior compromisso era consigo mesmo, se o tempo passava, ela não parava,
nada podia pará-la, ninguém podia detê-la...
Nos seus lábios não cabiam palavras
como: desconforto, desassossego, dúvida, especulação, angustia, trabalho
forçado, nervoso, impaciência, desperdício, danos, perdas, preguiça, mesquinharia,
informal, pejorativo... Machismo brasileiríssimo...
Quando ela tomava um café, começava
sua magia, ela respirava fundo fazendo uma força descomunal, girava um dos
dedos como varinha de cordão, sentia o cheiro gostoso de café, agradecia aos
céus e a terra pela oportunidade, concentrava-se na xícara, não tomava café em
copo, devagar se deliciava por poucos minutos com cada gota, com cada solução
tomada, com cada gole, a beberagem faz efeito, e com isso, ela renovava assim
suas energias e, logo, estava disposta para o trabalho...
Muitas vezes, ela dava-nos a
impressão de querer contar tudo, pedia silêncio com um dos dedos, saia de si por
um instante ou dois, com um olhar penetrante parecia nos conduzir para seu
perto e para seu longe, e lá distante, pensativa, revia um pensamento, uma
folha solta e como se descontroladamente chegava ao fim de sua história, quase
no fim da narrativa mandávamos voltar para nossas funções...
Olhando da cozinha, eu vi nela uma
descrição de Tigresa de Caetano Veloso: “Com alguns homens foi feliz, com
outros foi mulher”...
Ela preparava o discurso, uma carta,
um bilhete, um torpedo, acho que foi a primeira vez que a vi perder seu rebolado,
ela resolveu pensar e pesar as palavras certas... As acepções certas de sua
busca, quase no fim de um dicionário...
Não sei se quero continuar isto, as
palavras estavam quietas por demais, o silêncio passou de dois instantes, o
silêncio invadia tudo, uma aflição crescia, seus sofrimentos me alcançavam,
faltavam palavras, ela terminou dizendo:
- Vadia é quem sem se prostitui, leva
uma vida amoral ou devassa... Vagabunda é igual à vadia, diferente de
rapaliga... Vamos tomar um café, esquecer estas besteiras de uma vez, um amante
pode virar um amigo, mas um amigo nunca pode virar um amante...
Jorge Barboza
Escritor e Colunista
Social